O assunto é novo, e tem motivado um entendimento inconsistente da questão técnica no meio jurídico. Entendimento equivocado de que, sozinha, seria capaz de garantir a veracidade de seu conteúdo, o que é incorreto.
Em resumo, que seja assegurada uma confiança de que o registro não foi fraudado, modificado e que tem sua origem e conteúdo condizentes com a afirmação proferida sobre o objeto.
Diante disto, não é incoerente que o entendimento comum de uma “prova digital autenticada ou certificada” seja de que o fato nela registrado é verdadeiro. Porém, o mero registro na Blockchain tecnicamente não é capaz de prover este atributo.
Primeiro, existe uma grande complexidade técnica relacionada a veracidade de uma prova digital e não é possível garantir completamente isso por nenhum meio disponível atualmente, visto as múltiplas possibilidades de fraude e a fluidez do conteúdo digital. Por outro lado, podemos falar em provas mais confiáveis com relação a veracidade, em função dos meios empregados em seu registro.
No caso em questão, o procedimento realizado por diversas ferramentas de registro em Blockchain é relativamente básico, que consiste em registrar o código hash do documento indicado pelo usuário em uma Blockchain pública. O código hash é uma pequena “impressão digital” do arquivo e consistentemente usado para provar a existência e integridade de conteúdos.
Este procedimento está relacionado à um método de preservação da prova somente, no sentido de “preservar sua integridade”. Entretanto, para se obter confiança em seu conteúdo, é preciso medidas consistentes para se evitar a fraude ou contaminação dos conteúdos antes de sua efetiva preservação. Ou seja, antes de ser registrada na Blockchain, a informação precisa ser coletada e organizada, e nesta fase o conteúdo está altamente sujeito à fraudes ou contaminações.
Outra etapa relevante, é a coleta de metadados técnicos abundantes para uma auditoria conclusiva, que podemos chamar de “espelhamento técnico”. Esta operação também é importante para dar confiança na veracidade de uma prova digital.
Portanto, do ponto de vista técnico, o simples registro em Blockchain gera apenas prova de integridade e anterioridade do conteúdo, dando sustentação somente a argumentos relacionados à estes aspectos. Portanto, não há justificativa técnica que permita afirmar que este registro gere segurança quanto a veracidade do seu conteúdo.
Muito se fala da segurança da Blockchain, entretanto, a segurança se refere ao poder de gerar imutabilidade de dados somente, ativada após o registro dos dados digitais em sua rede. Esta imutabilidade impede que sejam feitas alterações depois do registro do conteúdo, porém, basta que haja o uso de um material previamente alterado para viabilizar uma fraude.
Apesar da complexidade técnica em garantir total veracidade, devido a dinâmica do meio digital, podemos afirmar que há meios para gerar mais confiança na veracidade de registros de provas digitais.
Com o uso de metodologias técnicas e de segurança, muitas delas já usadas por peritos forenses há muito tempo, que efetivamente evitem fraudes e contaminações no registro e permitam uma auditoria consistente do material relativo ao fato digital posteriormente, a partir dos metadados técnicos abrangentes.
Depois de coletado o material probatório, pode-se realizar o procedimento de preservação de integridade, que efetivamente pode ser feito com o registro do hash na Blockchain ou através do carimbo de tempo ICP/BRASIL (disponível há anos e regulamentado no país, apenas neste momento a Blockchain mostra sua utilidade.
Em resumo, a metodologia usada na coleta dos dados do fato digital refere-se à confiança na veracidade da prova, enquanto o método de preservação do material sustenta a prova de existência e garantia de integridade do conteúdo desde sua coleta.
Dr. Paulo Ricardo Ludgero
Advogado Criminalista – Membro Convidado da ANADD- Especialista em Crimes Cibernéticos/Digitais. Escritor. Palestrante. Professor. Especialização em Execução Penal PUC Minas. Especialização em Direito Criminal Empresarial FGV. Pós-Graduação em Direito Processual Civil na Universidade Cândido Mendes. Pós-Graduado em Direito 3º setor no CERS (Igrejas- Associações -ONGS) Doutorando Em Direito Penal e Criminologia na Universidade de Buenos Aires – UBA.
Não reproduza o conteúdo sem autorização do Autor ou da plataforma. Este site está protegido pela Lei de Direitos Autorais. (Lei 9610 de 19/02/1998), sua reprodução total ou parcial é proibida nos termos da Lei.