MomentoArquivo lembra discussão histórica sobre doação de herança para concubina
A Secretaria de Documentação do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por meio da Seção de Atendimento, Pesquisa e Difusão Documental, lançou a terceira edição do informativo MomentoArquivo.
A publicação mensal, disponível no site do tribunal, traz relatos rápidos e em linguagem leve sobre o julgamento de processos custodiados pelo Arquivo Histórico do STJ. São processos cujas decisões marcaram a sociedade brasileira nesses 30 anos de atividades da corte.
Nesta edição, o título é Alto lá! Concubina não… Companheira! A história fala de um processo julgado em 1989, em que se discutia a validade de doação de parte da herança a uma suposta concubina. O STJ levou em consideração as transformações sociais para resolver a controvérsia.
Acesse a página do MomentoArquivo para ler o texto desta e das outras edições, assim como suas referências.
Desde os tempos patriarcais aos dias atuais, o concubinato sempre causou muitas polêmicas.
Em 1989, o STJ analisou um processo que discutiu a validade de doação de parte da herança a uma suposta concubina. Em decisão inédita, o Tribunal criou um verdadeiro divisor de águas ao diferenciar companheira da simples concubina.
A concubina é a mulher dos encontros velados, do lar clandestino, oculto aos olhos da
sociedade; a amante do homem adúltero, que reparte, com a esposa legítima, as atenções do marido.
Já a companheira é a mulher que une seu destino ao do homem solteiro, viúvo, separado
de fato ou divorciado da esposa, e cuja união é vista pela sociedade como se casados fossem, em convivência pública e duradoura.
No caso analisado pelo STJ, um homem deixou em testamento parte da herança para uma mulher com quem viveu por sete anos. A legítima esposa e os filhos tentaram anular a doação, alegando que o art. 1719, III, do Código Civil de 1916, proibia expressamente legado à concubina do testador casado.
A suposta amante, simultaneamente à sua defesa, propôs uma ação contra a autora,
reconhecendo o concubinato e solicitando indenização pelos serviços domésticos prestados ao testador durante o tempo em que viveram juntos.
O juízo de primeira instância negou ambos os pedidos – o da família e o da amante -, mas
reconheceu a validade do testamento. Inconformados, a viúva e os filhos levaram o caso às instâncias superiores.
O tribunal gaúcho reconheceu a validade do testamento. Entendeu que aquela proibição
normativa não poderia incidir naquele caso, uma vez que a doação feita à concubina não atingiu a parte da herança que cabia à família legítima.
O STJ, além disso, levou em consideração as constantes transformações da sociedade, e
entendeu que, nos termos da nova ordem constitucional, tratava-se de união estável. E a mulher que coabitou com o falecido não era concubina, mas companheira. Assim, o Tribunal Superior reconheceu a validade da doação feita pelo testador.
O relator, ministro Sálvio de Figueiredo, disse que cumpre dar à lei uma interpretação
construtiva e atualizada, citando Pontes de Miranda: “há de interpretar as leis com o espírito ao nível do seu tempo, isto é, mergulhado na viva realidade ambiente, e não acorrentado a algo do passado, nem perdido em alguma paragem, mesmo provável, do distante futuro”.
Marcando época, o Tribunal da Cidadania distinguiu a condição da companheira da simples concubina, ampliou a proteção à companheira, e afastou a sua suposta incapacidade para receber doação em testamento.
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